ARTIGO: Os sete mandamentos da agricultura em 2016

Neste ambiente instável, a agricultura - que já vive cercada de riscos por todos os lados - precisará prestar muita atenção nas sete chaves do sucesso em 2016




A turbulência na política e na economia continuará em 2016. As expectativas dos agentes de mercado, refletidas no Boletim Focus do Banco Central, indicam queda de 3,62% no PIB em 2015 e encolhimento de 2,67% em 2016. O índice de confiança do consumidor permanecerá em baixa frente ao aumento do desemprego e da queda do consumo das famílias.

A crise atual é concentrada na indústria e nos serviços (queda de vendas, demissões), mas o que afeta o consumidor acaba afetando a cadeia produtiva do agronegócio. Neste ambiente instável, a agricultura - que já vive cercada de riscos por todos os lados - precisará prestar muita atenção nas sete chaves do sucesso em 2016.

Primeiro: Gerenciamento do caixa

A primeira regra é clara: manter a liquidez, dinheiro em caixa. Quem tem dinheiro em caixa pode, por exemplo, comprar melhor os insumos, obter receita financeira com a aplicação dos recursos, focar nos investimentos essenciais ao negócio. Quem tem dinheiro em caixa pode também aguardar oportunidade de investimento, pode comprar ou arrendar terras de produtores que estejam em dificuldades financeiras. Vale a máxima que sempre se repete: "a agricultura não quebra, muda de dono".

Segundo: Controle de custos

É certo: os custos agropecuários serão maiores na safra 2015/2016. Além do impacto do dólar sobre os preços em reais das matérias-primas e insumos importados, as despesas com energia, combustíveis e mão de obra também estão subindo mais que a inflação. E o produtor rural não tem controle sobre o preço dos fatores de produção que utiliza. Então, ele precisa gerir na ponta do lápis os gastos correntes e o orçamento de custeio até a venda da produção.

Em momentos de "bonança", de boas margens, é natural haver um "relaxamento" dos controles. Mas sempre dá para cortar despesas. E sempre é possível fazer mais com menos, reduzindo os desperdícios e os gastos supérfluos. Em outras palavras, é preciso focar nas ações para aumentar a produtividade dos fatores de produção (terra, capital e trabalho) utilizados na agropecuária. Existem ações de custo zero que geram economias como, por exemplo, caprichar na regulagem das máquinas, adubar de acordo com a qualidade do solo e a necessidade da planta. O olho e o bolso do produtor são dois lados da mesma moeda.

Terceiro: Aumento da receita

Preste atenção em dois pontos. Primeiro, os preços agropecuários nas principais bolsas do mundo deverão ser menos voláteis em 2016, a menos que ocorram novos acidentes climáticos. Os mercados de soja e milho já refletem a recomposição dos estoques mundiais, após a grande quebra de safra de 2012 nos Estados Unidos. O mundo continua abarrotado de estoques de algodão. Os preços do boi não terão mais força significativa de alta em 2016. O café sempre é uma incógnita, pois o clima interfere muito no tamanho da safra.

Segundo, o mercado interno será mais fraco, mas o ímpeto exportador será mais forte em 2016. Dada a relevância desses dois pontos, muitos vão dizer que é difícil para o produtor aumentar a sua receita. Revise os erros e acertos da venda da safra em 2014 e em 2015. Gaste muito mais tempo acompanhando o mercado futuro e o clima no mundo, conversando com amigos, ouvindo os analistas para, em cada momento do ano, formar uma visão sobre a evolução do mercado do seu produto. Tome decisões olhando para o futuro e não pelo retrovisor dos preços.

A decisão de como vender a safra resulta de três fatores: Razão (análise apurada), Intuição (experiência acumulada) e Ação (executar a decisão tomada), o chamado RIA. Nos mercados agropecuários não dá para "acertar na mosca", mas é possível aumentar a média anual dos preços recebidos e, assim, aumentar a receita.

Quarto: Ninguém manda no câmbio

A cotação do dólar e de todas as moedas no mundo, assim como os preços dos produtos agropecuários, é formada no mercado, segundo a velha (e pouco conhecida) lei da oferta e da procura. Os melhores consultores e analistas das tesourarias dos bancos dificilmente acertam na previsão da paridade R$ por dólar. Dizem que "a taxa de câmbio foi inventada para humilhar os economistas".

O mercado de moedas é mundial, depende de políticas de muitos países. Vivemos um período de fortalecimento do dólar norte-americano em relação às principais moedas do mundo. Com isso, o real se desvalorizou e o dólar subiu. Além disso, o quadro político confuso, as expectativas ruins e o receio dos investidores internacionais botaram lenha na fogueira e o dólar subiu ainda mais. Nem mesmo o Banco Central pode comandar o preço do dólar no Brasil.

Conclusão: vivemos um período de grande volatilidade, ou seja, alta e baixa da cotação do dólar. Recado ao produtor e demais agentes do agronegócio para 2016: não fique descasado em dólar, por exemplo, não faça dívida na moeda norte-americana se tiver receita em real. Trave o câmbio da melhor forma que puder. Em 2015, muito produtores e empresas ficaram descasados, com dívidas descobertas em dólar e estão com grandes problemas nas mãos.

Quinto: Produtor não é especulador

Sempre digo que "a agricultura não é uma ilha, mas é cercada de riscos por todos os lados". Risco de produção (impacto do clima, pragas etc.), risco de crédito (vender e não receber) e risco de preços (forte oscilação ou volatilidade). A função essencial do produtor é produzir e não especular.

O especulador não produz, nem processa, nem consome. Quem especula está disposto a correr riscos. Embora se divulgue mais a conotação negativa, o especulador é essencial nos mercados futuros, já que assume os riscos naturais dos produtores e processadores de bens agropecuários. O especulador dá liquidez ao mercado, senão o produtor ficaria nas mãos de poucos compradores.

No Brasil, os produtores são os grandes especuladores do mercado. Correm muito mais risco que frigoríficos, esmagadoras de soja e os exportadores de matérias-primas e seus derivados. Estes, fazem seguro de preços (hedge), não operam a descoberto. Quando retém estoques para venda futura, o produtor está, a rigor, especulando.

Nos Estados Unidos, entre 60% e 75% dos produtores fazem hedge, diretamente na Bolsa ou por meio dos armazenadores. A troca de produto por insumo (barter) é uma forma de travar os preços. O produtor precisa colocar o hedge na sua lista de promessas para 2016. O governo federal pode ajudar a integrar a Política de Garantia de Preços Mínimos aos mercados de derivativos em Bolsa, gastando menos e apoiando mais os produtores. O governo deveria, por exemplo, subsidiar a compra de um contrato de opção pelo produtor, facilitando o hedge. Os EUA fizeram isso nos anos 1990.

Sexto: Tecnologia sempre

A tecnologia é o vetor das grandes transformações no campo. Um breve retrospecto: no curto período das últimas dez safras (2004/2005 a 2014/2015), a produção de grãos cresceu 5,8% ao ano, a área plantada aumentou 2,0% e a produtividade cravou 3,7% anuais. Muitos produtores ainda precisam incorporar tecnologia, receber assistência técnica e testar e ampliar seus conhecimentos.

Há muito caminho a percorrer. A produtividade do milho no Brasil é metade da norte-americana: 5,4 toneladas por hectare aqui contra 10,6 toneladas lá. Nossas condições são mais diversas, mas no mundo ensolarado da competição isso não importa. Na soja, o Brasil está melhor: alcançamos 92% da produtividade dos EUA.

O produtor rural não pode descer do bonde da tecnologia. Revise sua estrutura de produção. Corte outras despesas e não jogue fora anos de investimento em tecnologias vencedoras, que reduzem os custos e melhoram a qualidade dos produtos.

"A produtividade agrícola representa a chave para um suprimento alimentar mais abundante e barato. É também a chave para a melhoria da renda e do bem estar da população rural", Theodore W. Schultz, Prêmio Nobel de Economia em 1979.

Sétimo: Só cresce quem investe

As contas mais justas do produtor (receitas versus despesas) vêm confirmando a expectativa de retração dos investimentos rurais. O crédito é um indicador. A contratação de crédito para investimento entre julho a novembro de 2015 foi de R$13,5 bilhões, caindo 56,8% em relação ao mesmo período de 2014. Em contraste, a área plantada de soja crescerá 1,1 milhão de hectares nesta safra.

Não devemos nos limitar à visão tradicional de investimento enquanto aumento do estoque de capital físico (aquisição de máquinas, equipamentos, terra). É fundamental uma visão mais ampla de capital. O conhecimento é a grande mola propulsora da formação de capital humano. Não deixe para depois. Em 2016, o produtor deve investir mais tempo estudando, pesquisando, organizando, analisando o mercado e treinando seus familiares e colaboradores.

Em qualquer cenário ou ambiente econômico, a capacidade empreendedora do produtor rural brasileiro sempre estará em cheque. Só cresce quem (bem) investe.

*Ivan Wedekin - Diretor da Wedekin Consultores, apresentador do "MomentoAgro do Brasil", programa do Canal Rural em parceria com o Banco do Brasil, e presidente da Câmara de Crédito e Comercialização do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
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